Teoria do design expansivo

Na minha tese de doutorado estou desenvolvendo uma teoria chamada design expansivo. Se o design promove o desenvolvimento de uma atividade humana, pode se dizer que ele está expandindo essa atividade. Mas qual é o design que não promove o desenvolvimento da atividade?

A automação é um bom exemplo: a atividade humana é reduzida em pequenas frações que podem ser executadas por uma máquina. Por mais que essa redução possa contribuir para a expansão de outra atividade, esse não é seu foco, por isso não é expansivo. Outro exemplo é a gestão sistemática, que busca aumentar o controle de uma determinada atividade, reduzindo a sua entropia. De forma muito explícita, o design da informação torna a atividade humana tão clara e simples que chega a beirar a caricatura.

Atividade de ir pra cama, do ponto de vista masculino e feminino

O design expansivo é aquele que expande a atividade para novos espaços, sejam eles conceituais ou físicos. Estes espaços limitam o que é considerado possível, portanto, para fazer o novo, para fazer o impossível, é preciso expandir o espaço da atividade. Esse espaço, porém, não é expandido por ideias mirabolantes, mas pela ocupação efetiva das possibilidades pela própria atividade, aqui e agora.

A ocupação se dá pela participação das pessoas que conduzem a atividade no processo de design. Elas tomam conta das ferramentas de design para delinear seu próprio futuro, reconhecendo seu poder transformador. As coisas ao redor, incluindo o próprio espaço, ganham relevância na medida em que se tornam modificáveis, passíveis de projetação. O design espansivo é a tomada de consciência efetiva da cultura material.

Nos parágrafos abaixo vou contar a história do projeto que me levou a formular a teoria do design expansivo. Será uma versão narrativa de um estudo de caso que estou escrevendo para um periódico de Construção Civil e Arquitetura.

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Um centro de diagnóstico médico estava sendo projetado no interior da Holanda para abrigar atividades existentes em dois hospitais diferentes. O projeto estava sendo conduzido sem a participação direta dos profissionais que conheciam as atividades nos hospitais, pois estes seriam meros usuários do centro. Neste papel, estes profissionais não se sentiam impelidos a fornecer informações detalhadas sobre suas atividades. Na verdade, a forma como os projetistas concebiam as atividades era muito diferente da forma como os profissionais concebiam: enquanto um queria saber sobre etapas e equipamentos, o outro queria falar sobre como fazer o paciente confortável.

Procedures cmi

A falta de informação sobre as atividades impedia, entretanto, que os projetistas tomassem decisões de design. Num certo momento, eles chegaram à conclusão de que precisavam incluir os "usuários finais" no design. Organizaram oficinas participativas com os profissionais dos hospitais para discutir e ajustar a planta baixa. Os projetistas ficaram na defensiva, respondendo todas as críticas dos "usuários" com as justificativas das decisões de design. Num dado momento de crise nas discussões, os profissionais da saúde pegaram uma folha de papel e rabiscaram uma nova planta baixa em colaboração com os projetistas.

Health participant drawing together anon thumb

À partir daquele momento, o design se tornou expansivo. Tanto os projetistas quanto os profissionais da saúde começaram a vislumbrar uma atividade nova acontecendo no centro: a troca de conhecimento entre os dois hospitais. Um grande corredor foi criado para os profissionais da saúde transitarem entre uma sala e outra do centro, promovendo encontros informais. O objetivo do centro, que era justamente promover tais encontros, foi recuperado e tomou forma no projeto da planta.

Antes depois cmi

Por outro lado, a atividade, que estava sendo quebrada em etapas pelos projetistas, se tornou relevante em sua totalidade pela personificação dos participantes. Sua presença no processo de design era essencial para preencher as lacunas e aliviar a preocupação dos projetistas com as incertezas. Além de contribuir com o design, os profissionais da saúde aprenderam entre si e voltaram aos seus hospitais com ideias para implementar lá também.

Estou estudando outros projetos com essas características e percebendo, cada vez mais, que a participação no design pode contribuir e muito para a mudança organizacional. Não é só a atividade dos "usuários finais" que se desenvolve, mas também a própria atividade de design, incluindo aquelas conectadas, como a construção do prédio, por exemplo. As pessoas se tornam conscientes das relações de trabalho que dificultam a colaboração e tratam de modificá-las a partir de já.

Eu tenho estudado, particularmente, o papel das representações no design expansivo, tal como a planta baixa e o rascunho mencionados acima. Apesar de terem características intrínsecas que induzem mais à redução (planta baixa) ou à expansão (rascunho), em última análise sua contribuição depende do uso, do propósito dado. Na arquitetura existem várias ferramentas de representação redutoras e poucas expansivas. Uma contribuição prática da minha pesquisa será a experimentação com formatos que suportam a expansão.

Essa teoria, embora tenha sido formulada no contexto do design arquitetônico, provavelmente é válida para qualquer tipo de design. Após a finalização do meu doutorado, buscarei a validação em outras áreas, em especial, o design de interação, que serviu de inspiração teórica e prática para minhas contribuições aos projetos arquitetônicos.

Fred van Amstel (fred@usabilidoido.com.br), 01.05.2014

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