Pequenos detalhes que encantam

No Design, um ideal que está cada vez mais em voga é o holismo, ou seja, a consciência de todos os múltiplos aspectos de um produto. É preciso considerar utilidade, beleza, emotividade, ergonomia, história, técnicas de produção, custos e todos os aspectos relevantes ao design. O produto deve ser coerente em todos esses aspectos e deslumbrante, já que o todo é maior que a soma das partes.

Como todo ideal, o holismo é inatingível na prática. Nem um batalhão de designers conseguiria dar conta de todas as possibilidades na criação de um produto. E mesmo que dessem conta, não conseguiriam controlá-las depois que o produto começasse a ser usado pelas pessoas. Mas, por perseguir o ideal, os designers fazem melhores previsões e os produtos tem maior chance de sucesso.

O holismo pode até ser usado como argumento de venda. Há alguns anos atrás, por exemplo, a Tramontina usava um slogan que acabou caindo no gosto popular: “Tramontina é BBB: Bom, Bonito e Barato”. Se antes de escutar o slogan uma pessoa achava que os produtos da Tramontina eram bons, agora ela poderia perceber que eles também eram bonitos e baratos.

Na hora de comprar, é muito complicado para o consumidor considerar todos os aspectos do produto em relação à sua própria vida. Enquanto não se pode usar o produto no dia-a-dia, não se pode saber o seu real valor. O máximo que ele pode fazer é observar como as outras pessoas usam e o que elas dizem sobre, mas isso toma tempo. O consumidor acaba, na maioria das vezes, escolhendo o produto por uma característica em particular que lhe chama a atenção, algo que ele tem certeza que terá valor.

Esse apego ao detalhe persiste depois que o produto passa a fazer parte da vida da pessoa. Aos poucos, a pessoa vai descobrindo em que local da casa o produto fica melhor, o que ele faz bem feito, com quais outros objetos ele combina e etc. Como a vida está sujeita às transformações da história, essas relações são constantemente modificadas. O que combina com o estilo de vida hoje pode não combinar amanhã; o que funciona hoje pode não funcionar amanhã. Esse processo de ressignificação não termina nem mesmo quando o produto é jogado fora.

Eu, por exemplo, não me esqueço da minha primeira bicicleta que ganhei do Papai-Noel; não me esqueço dos utensílios domésticos que comprei quando me casei; não me esqueço da primeira vez em que usei o iPod de um amigo.

O tempo passa, a memória muda. Algumas pessoas dizem que fica mais fraca, mas pra mim me parece o contrário. O que permanece na memória são as coisas importantes e, conforme ficamos mais experientes, nossa memória se torna mais seletiva sobre o que é importante.

Da bicicleta, eu me lembro da pegada do guidão; dos utensílios, eu me lembro do preço baixo; do iPod, eu me lembro do barulhinho que fazia ao girar o dedo sobre o disco central. Lembro desses detalhes porque foram importantes para a situação em que eu vivia e continuam sendo importantes hoje.

O holismo é uma abordagem interessante para o Design, mas o que encanta são os detalhes. Melhor do que tentar abranger todos os aspectos possíveis é buscar aqueles que serão mais importantes para as pessoas numa determinada situação. Perde-se em generalizações, ganha-se em particularidades. Não é à toa que produtos encantadores parecem que foram feitos sob medida...

Publicado originalmente na Revista Design do site da Tramontina Design Collection.

Fred van Amstel (fred@usabilidoido.com.br), 02.06.2007

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