É recorrente a oposição entre design e conteúdo. Fazendo uma analogia com o pão nosso de cada dia, é como se o design tratasse da casca que dá forma e acesso ao miolo: a embalagem do produto, as expressões gráficas do cartaz, os modos de uso do website, mas não a parte principal. O principal seria o conteúdo, objeto da Engenharia, no caso de máquinas, ou do Jornalismo, no caso de projetos editoriais.
Por mais que algumas pessoas prefiram comer as partes do pão em separado, casca e miolo se formam e existem em conjunto. Antes de ir pro forno, ambos eram uma só massa; depois, um ajuda a conservar o outro e, quando comidos, seus gostos se misturam. Não dá pra dizer que uma delas é principal porque uma não vive sem a outra.
Analogamente, design e conteúdo se encontram inextrincavelmente entrelaçados, tanto na produção quanto no consumo.
A oposição entre design e conteúdo é recorrente porque justifica e facilita a divisão do trabalho na produção: engenheiros ou jornalistas cuidam do conteúdo, enquanto designers cuidam da forma. Entretanto, isso reduz o campo de atuação de ambos os lados, causando uma cisão entre as áreas, o que acarreta em furos de projeto por falta de integração ou indefinição de aspectos híbridos. Por exemplo: de quem é a responsabilidade pela escolha dos materiais usados no produto? Do designer ou do engenheiro? Engenheiros escolhem com base em critérios como durabilidade ou resistência enquanto designers com base na moda ou nas sensações provocadas pelo material. Quando os lados não se entendem, o produto vira um “Frankenstein”: materiais que não combinam com a forma, identidades gráficas ridículas para o assunto tratado, boas idéias mal implementadas devido a limitações ou desconhecimento da tecnologia.
Os consumidores só percebem essas limitações quando o produto quebra ou falha numa tarefa. Antes disso, o produto é um só. O carro é um carro, mas quando quebra... vira um amontoado de rebimbocas da parafuseta! É aí que os consumidores se conscientizam da existência das partes do produto e começam a pensar se não houve falha no processo de produção.
A análise, ou seja, a separação minuciosa das partes do todo é um recurso útil para a identificação da causa de problemas. Separando design do conteúdo, podemos encontrar falhas pontuais, como erros de ortografia ou materiais escorregadios, mas dificilmente vamos entender falhas globais ou recursos ausentes. As partes são dependentes uma das outras porque são produzidas e consumidas uma em relação às outras, ou seja, em relação ao todo. Por isso, é preciso ir da análise à síntese, onde o todo é reconstituído.
Existe uma máxima no Design, oriunda da teoria da Gestalt, que diz que “o todo é maior do que a soma das partes”. É maior porque o todo inclui as relações entre as partes, que transformam as partes mutuamente (pense como as pessoas mudam depois de uma relação como um casamento). Se queremos captar o todo, precisamos considerar a relação co-constitutiva entre design e conteúdo. A forma também informa, engrenagens podem ser bonitas e o texto é sempre tipográfico. Podemos afirmar, portanto, que conteúdo é design e design é conteúdo.
Fred van Amstel (fred@usabilidoido.com.br), 06.09.2007
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