O Facebook muda de layout com mais frequência do que as outras redes sociais, incorporando as mudanças nas atividades dos seus usuários e por isso consegue manter maior longevidade. Farei uma análise do layout da página de perfil para sustentar essa tese.
No livro Homepage: Usabilidade, Jakob Nielsen divide o espaço da página inicial de 50 sites famosos de acordo com suas funções e mostra que há muito espaço desperdiçado com opções de navegação e propaganda. Sobra pouco espaço para o conteúdo.
O livro é bacana, mas está completamente desatualizado, pois as páginas citadas já mudaram muito desde aquela época, fora as mudanças de comportamento do usuário em que as recomendações de usabilidade estão baseadas. Porém, ele faz uma proposta muito clara de que o design das páginas deve seguir a atividade do usuário.
Minha análise se baseia no mesmo método de demarcação espacial, porém, aplicando a uma mesma página ao longo dos anos: a página de perfil de usuário do Facebook.
Fiz uma busca pelo Google atrás de capturas de tela dessa página disponibilizadas na web, determinei uma área de corte (781 x 743 pixels) já que o layout mudou de tamanho ao longo dos anos, e dividi o espaço de acordo com as seguintes funcionalidades:
Veja como ficou a demarcação espacial da primeira página de perfil que consegui encontrar, de 2004, quando o Facebook tinha até outro nome.
Minha análise contém distorções, pois não se tratam de capturas do perfil da mesma pessoa. Algumas opções estão abertas ou fechadas, as fotos variam de tamanho, etc. Porém, o ponto dessa análise não é mostrar dados precisos de quanto espaço da página é dedicado à cada funcionalidade, mas sim ressaltar o esforço do Facebook em acompanhar as mudanças nas atividades dos usuários.
O espaço branco que dava um respiro para a quantidade de informações se foi logo no começo, substituído primeiro e por publicidade e depois por algo mais relevante. Os interesses estáticos deram lugar à timeline, que também mostra interesses, só que de forma dinâmica. A timeline logo se tornou hegemônica, mas recentemente foi jogada pra baixo, ficando fora do escopo desta análise. Os dados pessoais foram movidos de um lado para o outro do layout, mas permaneceram com a mesma quantidade de espaço. A navegação encolheu e se tornou mais minimalista. O caso das fotos vale à pena citar em detalhes.
O gráfico de áreas demonstra que as fotos foram ganhando mais e mais espaço, na medida em que os usuários começaram a compartilhar mais fotos na rede social. A introdução do botão "like" em 2009 foi essencial para incentivar as pessoas a compartilhar mais fotos, pois assim os amigos podem demonstrar que viram as fotos sem fazer grande esforço. As pessoas passaram a postar fotos com a certeza de que alguém vai vê-las, algo que nenhuma outra rede de compartilhamento de fotos podia oferecer.
Quando as últimas fotos começaram a aparecer no topo do perfil em 2010, alguns usuários espirituosos aproveitaram para parecer maiores do que o Facebook permite. Esse hack é o precursor da funcionalidade de foto de capa, introduzida em 2012.
O Facebook já oferecia a opção de marcar pessoas nas fotos, porém, a interface era difícil de usar. A simplificação desta interface e a incorporação de sugestões baseadas em reconhecimento facial em 2010 aumentaram ainda mais a chance das fotos serem vistas. A marcação de uma pessoa se torna um chamado a olhar a foto, comentar, ou apenas dar um like.
Alguns usuários descobriram que essa funcionalidade poderia ser útil para divulgar eventos, convidando a pessoa a olhar o cartaz de divulgação, porém, a foto aparecia marcada no perfil da pessoa como se fosse uma foto dela, o que obrigou o Facebook a acrescentar um botão para remover a foto do perfil. Em 2012 a ferramenta de eventos é reprojetada e a divulgação de eventos através de marcação em fotos diminui.
Esta análise demonstra que o Facebook tem reagido rapidamente às mudanças nas atividades dos usuários, incorporando os hacks e usos desviantes como novas funcionalidades. É nítido o esforço da empresa em acompanhar a maneira como os usuários constróem seu próprio espaço a partir da rede social, sempre trazendo algo novo e relevante para ser apropriado.
Apesar de incentivar a apropriação de sua plataforma, o Facebook não coloca em questão a sua propriedade. Embora os usuários estejam contribuindo para a evolução do Facebook quando o utilizam, eles não têm direito a interferir diretamente no layout ou cobrar qualquer tipo de compartilhamento nos lucros.
Estou estudando no doutorado qual poderia ser o papel do design nessa relação dinâmica entre espaço e atividade, considerando o longo prazo em que essas transformações ocorrem. Aqui vimos como o design do Facebook está sempre correndo atrás do prejuízo em relação à atividade do usuário. Mas e se fosse ao contrário? E se o design fosse uma maneira de expandir a atividade do usuário?
Com essa perspectiva, abre-se caminho para considerar o usuário um participante do design, trabalhando para expandir suas próprias atividades enquanto projeta o espaço. Esse caminho leva a um espaço muito mais responsivo a atividade do usuário porque o usuário não só se apropria dele, mas conquista sua propriedade, compartilhada com os demais usuários.
Como seria uma rede social projetada assim?
Planilha com os dados da análise [XLSX]
Capturas de tela
Fred van Amstel (fred@usabilidoido.com.br), 05.04.2014
Veja os coment?rios neste endere?o:
http://www.usabilidoido.com.br/distribuicao_de_espaco_no_facebook.html